sexta-feira, 8 de abril de 2011

JESUÍNO MARABÁ - PARTE III

VIM CUMPRIR MINHA PROMESSA E BUSCAR O QUE ME PERTENCE

"Era noite. O vento soprava forte. Tão forte, seu Paulo, que avelha mangueira do quintal se vergava por sobre a nossa casa. Nas paredes da cozinha, nossas sombras dançavam tremidas no compasso da chama da poronga que se mantinha viva com muito sacrifício. Aquele temporal era anúncio de algo ruim. Eu estava na mesa em companhia dos meus pais. Soldado, junto dos meus pés, soltava grunhidos estranhos. Conceição já tinha se recolhido pra dormir. Lá fora, relâmpagos riscavam todo o céu. De repente, como que surgido do nada, bem a nossa frente, junto da porta, Jesuíno segurava em uma das mãos um enorme terçado. Até hoje quando fecho meus olhos, só consigo enxergar ele naquela posição ameaçadora. Me lembro que um raio desabou alumiando todo o interior da casa. Foi quando pude ver o brilho de ódio saindo daqueles olhos negros que cuspiam fogo: "Vim cumprir minha promessa e buscar o que me pertence." Esbravejou Jesuíno investindo em nossa direção. Foi tudo muito rápido, seu Paulo. O primeiro que provou da sua fúria foi o meu pai que teve a cabeça decepada com um único golpe de terçado. Ainda escapou de um grito de clemência, jesus!! que se perdeu no ar. Depois ele se virou na direção de minha mãe que estava no outro extremo da mesa e decepou-lheos braços - um de cada vez - e em seguida, enterrou fundo o terçado em seu peito com tamanha violência que a arma lhe varou as costas. Apavorado, deslizei por debaixo da mesa sobre o sangue dos meus pais e fui sair á porta ganhando o rumo de fora. Fugia desesperado da morte que me era certa. Atrás de mim vinha Soldado. Jesuíno vinha logo atrás gritando feito louco, como se fosse o próprio demônio:
"VOU TE SANGRAR E BEBER O TEU SANGUE!" Gritava sem parar o demônio. Sem que eu percebesse, fui me embrenhando mata á dentro. O tinhoso cada vez mais perto. Até hoje não consigo acreditar como pude subir naquela árvore gigantesca tão depressa. Talvez tenha sido mesmo o medo junto a vontade imensa de viver que me deram tanta destreza. Já Soldado, não teve a mesma sorte, pois que uma terçadada certeira o alcançou partindo o animal no meio. Uma parte dele ainda grunhia como um condenado até morrer. O senhor me acredite, por favor. Pois bem, prendi a respiração e o grito que queria fugir da mi nha garganta. Da copa da árvore, meus olhos esbugalhados de medo e pavor, acompanhavam o desalmadoa me procurar em derredor, lá embaixo. Não sei se o senhor vai mesmo acreditar em mim, seu Paulo, seria até pretensão minha que acreditasse, mas fiquei ali na copa daquela árvore durante cinco longos dias."
"Acredito! Claro que acredito. O medo nos prega muitas peças.' Adiantei-me.
Nova pausa. Mais talagada de cachaça.
"Quando me voltou a coragem e com ela a certeza de que o perigo não mais existia, foi que desci daquela árvore. Andei vários dias desnorteado pelo mato sem entender o motivo de tamanha crueldade. Tudo havia acontecido tão depressa que só naquele instante me dava conta de todo aquele pesadelo que passei. Via meus pais mortos mergulhados no próprio sangue. Pensava em minha irmã. Não sabia se estava viva ou morta. Todas essas lembranças me formigavam a cabeça. Só pensava em morrer; me atirar do primeiro barranco que encontrasse no caminho. E no meio de toda aquela tortura, fiz um juramento: só descansaria no dia em que ajustasse contas com Jesuíno e vingasse a minha família.
Dias depois, soube por informações, que Jesuíno se tacara para Manaus levando com ele minha irmã. Nem pestanejei. Pedi passagem num barco e parti naquele rumo...

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