terça-feira, 8 de maio de 2012

O ANÂO DO AÇOUGUE

PARTE II - SEPARAÇÃO Naquele mesmo dia havia estourado toda a grana e voltei bem tarde para casa. Bêbado, fedido; aos pedaços. Tomei um banho demorado, bati uma punheta pensando na Dagmar e me enfiei na cama ao lado de Selminha que dormia como uma pedra. Tive sonhos pesados. Num deles sonhei que eu era um imenso barco e que naufragava em merda. Meus pulmões se enchiam de merda. Me afogava em merda. Selminha me deu umas cotoveladas e eu despertei daquela premonição on~irica, escrota. Ela, ao contrário, havia sonhado com cobra. Acordou cedo toda pronta e cheirosa me dizendo que havia sonhado com cobra. "Sonhei com cobra esta noite, e cobra é traição." "Que cê quer dizer?" "Que para mim chega, Mário Augusto." Depois ouvi seus passos pela cozinha. O seu perfume forte. O toktok frio e seco dos seus saltos altos. Minha cabeça latejava. Tentei ligar a televisão, mas o controle estava sem pilha. Olhei e vi sua mala pronta no canto do quarto. Senti o cheiro de comida. Selminha sempre deixava tudo pronto antes de sair para o trabalho. Até ali, tudo bem. O foda era aquela sua mala pronta no canto do quarto. Não costumava ficar sobre o guardarroupa? "O que tá acontecendo? Ainda sâo seis da manhã. E essa mala pronta?" "Estou deixando esta casa. Saindo da tua vida. Não quero mais isto para mim. Chega, Mário Augusto." "Caralho, vamos conversar!" "Não tem mais conversa entee a gente. Saio hoje da tua vida. Agora e já!" Sentei á beira da cama atordoado. Nâo sabia o que pensar. A verdade é que já não nos entendíamos algum tempo, e por cinta disso, Selminha vivia prometendo me deixar. Entrei em pânico. Se Selminha me deixasse, eu estaria fodido. Quem iria me sustentar? Estava desempregado. "Vamos conversar, amor." "Amor uma ova! Vou deixar a comida pronta e o dinheiro do açougue. Depois, tu te vira!" Caminhou até a porta. Havia muita raiva e veneno naquele toktok dos saltos. Eles me mandavam á merda. Sequer olhou para trás. Estava mesmo decidida. Depois que ela fechou duramente a porta na minha cara, arrastando aquela sua mala, é que vim sentir na pele que ela falava mesmo á sério. Selminha partiu. Fiquei grogue uns dias, sem saber o que fazer. Nâo tinha profissão áquela altura de vida. Acho que nunca tive. Queria ser escritor, mas escritor não é uma profissão e não dava dinheiro, além do mais, como ela mesma costumava dizer - literatura não põe comida na mesa. (Minha velha também vivia me dizendo isso). Embora me empenhasse o bastante, no fundo elas tinham razão: os livretos que eu escrevia não ajudavam muito. TODO ARTISTA OU ELE FICA SÓ OU ELE PROGRAMA A MULHER (Ecumênicus me falou certo dia sobre isso e ei fiquei pensando onde exatamente eu encaixaria esta máxima). Passei a beber o dobro do que bebia. Olhava a escuridão da janela e chorava sempre quando ouvia aquela música do filme AEROPORTO 77. Um dia me enchi de ficar enchendo a cara, olhando a escuridão da janela e ouvindo aquela música do AEROPORTO 77 e fui até o açougue mais próximo comprar comida. Foi aí então que o anão entrou na minha vida e tudo mudou... (continua amanhã)

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