quinta-feira, 24 de novembro de 2011

O ENTERRO DO ANÃO

I – a vida é um charco

É claro que isso não vai dar em nada, eu sei, mas o fato é que eu estava lá, saca? bêbado e completamente desnorteado bem no meio daquela praça de guerra - às duas da manhã de um sábado qualquer, cercado de bebuns por todos os lados. Catei novamente o fundo dos bolsos e necas! nem carteira nem nada. A puta havia levado tudo. Ainda podia sentir na jugular, o frio do aço do seu canivete. Roubado por uma puta. Sacanagem. Definitivamente, mel e conhaque não combinam. Quando é que vou aprender? Estava pensando nessas coisas quando um daqueles bebuns virou pra mim e disse:
“Tonho é o aleijadinho ali. espie o senhor! o porco comeu a mão dele. Ficou engraçado sem a mão. Dizem que a patroa viu tudo do portão e não fez nada. Ficou vendo o porco comer a mão dele no quintal e não fez nada. Depois ela o largou por outro. Foi vingança. Todo mundo aqui sabe que foi vingança. A vida é um charco, meu senhor. Mas tome outro gole. O senhor tá branco. O senhor veio subindo a Frei José dos Inocentes que eu vi. Quem vem da Frei José, para sempre aqui, senta e fica olhando a noite mastigar o vazio. Mas beba rápido antes do Exército de Cristo chegar.”
“Exército de Cristo? que porra é essa?” achei que era alguma sacanagem dele. Tomei um gole da sua aguardente que me oferecia e senti um pouco de alívio na alma. A praça girava ao meu redor. Dali há instantes, vi o tal exército chegar. O cara não estava de sacanagem, não. Os caras chegaram num comboio de kombis e usavam umas fardas verdes imitando as fardas do exército. Depositaram um enorme panelão de sopa fumegante bem no centro da praça e alguns bebuns se arrastaram até lá como umas lesmas condenadas. outros caíram fora. Uma caixa de som foi ligada e um dos soldados começou a pregar as verdades de Cristo. Vi a veia dele aparecer no pescoço. Depois ela queria saltar de lá. Olhei e um outro soldado de cristo enorme e bem nutrido apoiava pesadamente uma das suas mãos sobre a cabeça de um dos bebuns como se quisesse afundá-lo na terra. Falava que queria arrancar o demônio de dentro dele. Eu olhava para àquela cena deprimente, mergulhado numa espécie de semidevaneio. Minha cabeça agora girava com a praça. Teimava em acreditar que ainda restassem alguns trocados no bolso, mas a puta havia mesmo raspado tudo. Mel e conhaque te levam ao nocaute. Te deixam mesmo fodidão. O pé inchado ao meu lado já tinha dado o fora. Uma moça de saia longa e bastante atraente se aproximou e me entregou um folheto: “a verdade de cristo te libertará!” Disse ela. Mas eu já estava possuído e de pau duro. De modo que, não tendo muito o que perder, peguei levemente sua mão e a conduzi levianamente até o meu pênis duro e disse: “A verdade talvez esteja aqui, irmã!” ela puxou imediatamente sua mão dali e me fulminou com um olhar furioso:
“O demônio usa de muitos artifícios.” Disse ela colocando sua mão sobre minha cabeça. A outra ocupava-se segurando uma pequena bíblia:
“Usa mesmo.” eu disse.
“Precisas conhecer a verdade. Só a verdade liberta”.
“Já conheço a verdade, irmã, e estou muito bem com ela.”
“Só existe uma verdade, moço.”
“É? qual?”
“A verdade de nosso senhor Jesus Cristo.”
brrrp. Bateu-me aquele frio escroto da madruga. Não queria tornar aquilo um debate, juro. De modo que comecei a alisar sua mão que repousava sobre minha cabeça. Então eu disse:
“A verdade dele talvez não seja a minha verdade.”
“Como assim?”
“Escute, por que não vamos para outro lugar discutir sobre nossas verdades.”
“O senhor está bêbado e não sabe o que faz e o que diz. por isso, relevo o senhor.”
“E a senhorita tem uns olhos claros e lindos como a de Santa Edwirges.” Santa Edwirges? porra, fui arrancar aquela santa das minhas mais profundas masturbações. Minhas mãos dessa vez tocaram de leve suas pernas que eram torneadas e estavam cobertas por uma saia longa que se estendia até os tornozelos. Olhei bem pra ela. Tinha um rosto parecido com o rosto da garçonete do Bar Holandas. Meu pau deu uma pinicada. Tratei de pressioná-lo com certa força, abarcando também os colhões. Se chegasse inteiro em casa, bateria uma bela punheta, na certa.
“O senhor não tem noção do que diz e do que faz.”
minhas mãos deslizavam agora pelas suas pernas suadas e frias. era como se eu alisasse um torno de gelo derretendo.
“O sangue de nosso Senhor Jesus Cristo banhará o senhor e removerá todos os seus excrementos!”
“Humm, gostei disso.”
“Expiará os seus pecados.”
"Fala mais, fala mais, vai!”
Minhas mãos agora subiam na direção de suas coxas.
“O senhor não tem mesmo noção do perigo, moço!”
“Han, han. não mesmo.” aí ela gritou: “Jarbas!” Olhei e vi um cara corpulento vindo em minha direção. Um brutamontes: O mesmo que há pouco afundava com as mãos a cabeça de um dos bebuns, expulsando os demônios de dentro dele.
“Este é meu irmão Jarbas. Ele vai lhe falar um pouco das verdades também”. Senti os punhos grandes e fechados de Jarbas na minha cara.
“Não precisa, Jarbas! já estava de saída.”
Dei meia volta e caí fora dali.

(continua)

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